A familiaridade com os doces veio da infância quando ela disputava com os irmãos as raspas da sobremesa feita com capricho pela mãe nos tachos de cobre. O cheiro adocicado invadia a casa na Fazenda São Sebastião, em Pouso Alegre, sul de Minas, e alimentava o sonho da filha caçula de algum dia produzir e vender um doce de leite feito por ela na fazenda do pai. Hoje, Rosi Barbosa, 35, e o marido e sócio Raphael Figueiredo, 33, são donos da Rocca, uma empresa especializada em doce de leite que é sucesso de vendas em Minas Gerais. Criada em 2014, o faturamento da empresa no ano passado foi de R$ 2 milhões.
Foi durante uma palestra sobre empreendedorismo, em Varginha (MG), que Rosi, advogada, confidenciou ao então namorado Raphael a ideia de tornar rentável a tradição familiar. Sem qualquer intimidade com o campo, Raphael, que nasceu em Belém (PA) e se formou em Engenharia de Telecomunicações, apostou no negócio e, no dia seguinte, traçou um mini projeto para a futura empresa. O plano incluía compra de parte da fazenda do pai e vacas para produzir o leite.
Matéria prima eles já tinham. Produtor rural há 58 anos, o pai de Rosi, José Barbosa, 77, conhecido na região como “Zé Pequeno”, criou e educou os seis filhos (três homens e três mulheres) com a venda do leite produzido na fazenda. Até então, o produto era comercializado para laticínios locais e estava sujeito às variações de preço naturais do mercado - o produto era vendido como commodity. Para complementar a renda familiar, a mãe Lázara, produzia geléias de frutas em uma pequena fábrica na propriedade.
Com um investimento de R$ 20 mil, empréstimo do pai de Raphael, o casal comprou o primeiro tacho industrial de 250 litros para iniciar a produção, mesmo sem conhecer as técnicas para fazer o doce, qualquer noção de indústria e até espaço físico para a empreitada. No início, eles dividiam, em dias alternados, a antiga fábrica de geléias da mãe e do irmão. “A idéia original era agregar valor ao leite in natura, melhorar o preço pago ao produtor e oferecer um doce caseiro, de qualidade, sem uso de conservantes”, conta Raphael.
Os desafios persistiam, mas o sonho de dar continuidade ao trabalho do pai estimulava a caçula dos Barbosa. A advogada largou o emprego na prefeitura de seu município e Raphael o cargo numa grande empresa telecomunicações e fundaram a Rocca, cujo nome deriva de roça. Segundo Rosi, utilizando apenas leite e açúcar, sem aromatizantes e conservantes, foi um ano testando e aprimorando as receitas até desenvolver três tipos de doces, o tradicional; doce de leite com café, que vem conquistando cada vez mais os apreciadores do doce, e de coco. “Fazíamos tudo, produção, rotulagem, vendas para amigos, entregas, recebimento e compras. Os erros foram nossos acertos, até chegar à receita conhecida hoje”, diz Rosi.
Com a compra da antiga fábrica de geléias, há um ano e meio, começaram uma reforma para atender exigências da fiscalização e obter os selos de certificação. “A expectativa é trabalhar com 15 mil litros de leite. Atualmente a produção diária é de 300 potes do doce. Com a conclusão da reforma nas instalações da fábrica, a capacidade de produção será dez vezes maior”, estima Raphael. A casa onde Rosi nasceu e cresceu com o cheiro do leite hoje é o escritório da fábrica que emprega 16 funcionários.
A fabricação do doce de leite da Rocca, que começou com 50 litros de leite produzidos na própria fazenda do pai, hoje conta, no total, com 1.200 litros de leite – 400 litros da fazenda e 800 litros de cooperativas da região. A produção é de 13 toneladas de doce. No primeiro ano de fundação (2014), a Rocca faturou R$ 200 mil e no último ano (2018) chegou a R$ 2 milhões. A previsão é dobrar a produção do doce de leite neste ano, 2019, R$ 4 milhões, e quadriplicar em 2020, além de criar uma linha Food Service, focada em restaurantes e outras empresas alimentícias.
Recentemente, o casal fechou uma parceria com uma empresa brasileira de insumos, importação e exportação por meio de uma joint venture para produzir o doce de leite da Rocca no Uruguai. “Esse produto será supervisionado por nós, onde acompanharemos com freqüência a produção, para garantir que o doce chegue ao Brasil com a mesma qualidade e características daquele feito aqui”, explica Rose. Serão baldinhos de 5 quilos, com o selo federal, para atender o comércio de sorveterias, confeitarias e restaurantes.
De posse do selo do Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA) desde janeiro deste ano (2019), eles estão trabalhando para alcançar o selo federal e atingir os estados de São Paulo e Rio de Janeiro. Atualmente, o doce de leite da Rocca pode ser encontrado em embalagens de 50 e 420 gramas em redes de supermercado, lojas especializadas, padarias e empórios.
O sucesso na produção do doce de leite também foi uma forma de se conectar ao pai. “Eu fico muito orgulhoso dela dar continuidade ao meu trabalho, de não deixar morrer essa tradição da família, esse amor pela roça”, diz emocionado Zé Pequeno. Ele e o “cãopanheiro” Tom, continuam “na lida”, no cuidado e manejo das 36 vacas leiteiras da raça holandesa e ainda chamando cada uma pelo nome: Formiga, Lindóia, Lagoa, são algumas delas.
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